O sonho da morte de Cassandra - Ato IV

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O sonho da morte de Cassandra

 Ato IV

 

"Meu coração corria mais que os esquilos da floresta, agora todos adormecidos. Eu gritava, mas ninguém me ouvia, nem mesmo eu me escutava."

 

" A sombra enegrecida do acampamento era evidente. Nenhum dos meus colegas surgia para me salvar daquela enrascada - uma armadilha de urso - que estraçalhava o meu pé e eu via sangue por todos os lados e minha carne estava escura. Veias já não enviavam sangue, mas sim algum tipo de óleo roxo e escuro. Meu coração corria mais que os esquilos da floresta, agora todos adormecidos. Eu gritava, mas ninguém me ouvia, nem mesmo eu me escutava. Minha voz saia como um guincho quase imperceptível ao longo do imenso bosque. Aquela escuridão me cegava e o medo se escondia na minha nuca cortando a coragem como uma navalha afiada. Meus olhos não viam nada além de arvores negras e sombras selvagens.
As barracas de acampamento caídas no chão de terra molhada dava uma visão de morte total, uma desolação de um animal em fúria que sai destruindo tudo a sua frente. Eu via corpos por todo o canto, espalhados sobre o terreno pisoteado e manchado se sangue. Minha amiga Anna estava pendurada pelo pescoço numa arvore escura e sem folhas, toda seca. Numa forca tenebrosa ela me olhava. Seu oco e vazio rosto mostrava o meu destino, aqui presa nessa armadilha dos infernos. Um metal gelado prendia minha perna e o frio me lambia dos pés a cabeça como se fosse uma noite de inverno. Queria estar em casa tomando uma xícara bem grande de chocolate quente, em vez disso, aqui estou eu, presa num cemitério ao ar livre cheio de morte rondando-me a espera da minha hora. O oco onde antes continham os olhos de Anna me seguia, me vigiava e prendia minha atenção, era como se tivéssemos conversando. Eu com minha boca carnuda e Anna com a sua parcialmente arrancada. O ar estava melancólico e ela dava uma visão fantasmagórica com seu roupão branco manchado de sangue, borrifando ainda de suas veias o que lhe restava. Suas entranhas e órgãos pendiam por além do corpo, formando assim a morte mais terrível que já presenciei.
Seu corpo estava fétido, sua cor pálida chamava os meus fantasmas para dançarem. Uma morte esplêndida sorria para mim que retribuía o sorriso involuntariamente. Depois de uma leve piscadela eu me via em outro lugar. Dessa vez um bem aconchegante, estava numa barraca muito ampla e bonita, porém a minha frente outro corpo pendia morto por uma corda. Ele girava e girava como um ventilador quebrado. Seu rosto também me era familiar, era uma pessoa muito querida. Meu namorado jazia com um corte profundo na garganta, pareciam que lhe cortaram de orelha a orelha. Num súbito solavanco eu acordei novamente, que sonho perturbador eu tive, e diferente, bem diferente. A morte parecia me rondar cada vez mais de perto. "